Resenha: "Quem me roubou de mim?" de Fábio de Melo
Recentemente lí o livro “Quem me roubou de mim?” de Fábio de Melo. A leitura apresentou-se como uma grata surpresa capaz de superar a minha barreira inicial preconceituosa sobre um livro escrito por um padre católico. De mesmo modo que vários de meus amigos, desde criança eu me sentí deslocado no meio da religiosidade cristã, optando como alguns deles por conhecer outros tipos de religiosidade. O legal é que o livro “Quem me roubou de mim?” me foi dado de presente pela esposa de um amigo que é atéia. Pois bem, o livro não trata prioritariamente de religião alguma mas daquilo que é chamado pelo autor de “sequestro da subjetividade”. A narrativa de “Quem me roubou de mim?” concentra-se em contar várias histórias reais de pessoas que foram sequestradas de sua subjetividade e junto com essas histórias oferecer opiniões filosóficas sobre o assunto. É um livro curto, que pode ser lido em uma ou duas tardes, e que possui uma leitura fluida comum para os pequenos contos que a formam. Sobre sequestro da subjetividade o autor diz entre outras coisas:
“É sequestro da subjetividade todo o processo que neutraliza e impede o ser humano de conhecer-se, passando a assumir uma postura ditada por outros. É sequestro da subjetividade a projeção da vida humana em metas inalcançáveis, costurada à mentalidade de que as pessoas são perfeitas e que há sempre um final feliz reservado, pronto para chover do céu sobre nossas cabeças.” - Fábio de Melo; Quem me roubou de mim?
“Quem me roubou de mim?” começa estabelecendo um paralelo entre o sequestro físico, crime típico em que uma pessoa é fisicamente removida do seu ambiente e levada até um cativeiro por um sequestrador e o sequestro de subjetividade, processo semelhante em que um indivíduo fica preso em uma relação limitante e perde a direção de sua própria subjetividade, ou seja, torna-se refém. A despeito do meu preconceito inicial e de ser um livro curto e despretensioso, a leitura é muito interessante e reflexiva e acredito que o tema do sequestro da subjetividade tem um potencial de criar identificação com muitos leitores. Sou particularmente interessado pelo tema da autonomia nos relacionamentos e as histórias contadas no livro por várias vezes me trouxeram reflexões interessantes. São histórias protagonizadas por pais e filhos, namorados, namoradas, maridos, esposas e indivíduos sequestrados de sua subjetividade por medo, necessidade, sedução, autoritarismo ou baixa auto estima e apesar da delicadeza desses temas, Fábio de Melo os investiga de forma honesta sob a luz da filosofia e da empatia. Fiquei surpreso durante a leitura do livro ao ver como o autor trata algumas temas, como o desejo e a felicidade. Por exemplo quando o autor faz uma defesa da importância do desejo em nossas vidas contrapondo o desejo como força motivadora do ser humano com o prazer frugal e repentino. A conclusão exposta pelo autor de que as pessoas que são sequestradas de sua subjetividade tornam-se tão indisponíveis pra si quanto para os outros também me fez refletir durante um tempo. Antes de tudo o livro reconhece a humanidade dos indivíduos e deixa perguntas no ar do começo ao fim, e se você já esteve em relações de sequestro de subjetividade ou mesmo viu alguém que você ama preso nessas relações, o livro é uma leitura recomendada que pode te fazer refletir e aumentar o seu nível de empatia.